Quartos estão encolhendo. O espaço vai para a sala
em O Antagonista, 31/julho
Três em cada quatro imóveis lançados em São Paulo tem menos de 45 m2. Organizar o espaço virou uma prioridade.
Que os apartamentos estão diminuindo de tamanho, é um fenômeno já conhecido há vários anos. A nova tendência que está se tornando visível no mercado imobiliário, porém, é que, dentro desses imóveis, os quartos estão ficando cada vez menores.
A tendência é mundial, e o mercado brasileiro não está livre dela. O que acontece é que ela se manifesta mais rapidamente em mercados onde o metro quadrado alcançou valores muito elevados, como os bairros nobres de São Paulo e a Zona Sul do Rio de Janeiro.
Entre os efeitos que a pandemia trouxe para o comportamento dos compradores, passaram a ser valorizados os espaços de convivência familiar, ou simplesmente os que permitem múltiplas atividades – desde trabalhar e fazer teleconferências até praticar yoga ou cozinhar para os parentes ou amigos. Então, o conceito de cozinhas abertas para a sala, assim como varandas multifuncionais, se firmou definitivamente.
As salas ganharam televisões de telas maiores, com home theater, e passou-se a investir mais em decoração. Logo as pesquisas das construtoras passaram a mostrar que o espaço destinado à sala, cozinha e varanda devia engolir parte do espaço antes usado pelos quartos. A tendência foi identificada pelo relatório anual de tendências da IKEA, multinacional de móveis, que fica sempre de olho nas mudanças de hábitos de consumidores e construtores, para poder adaptar seus produtos.
Apartamentos menores
No Brasil, o mercado tem favorecido apartamentos menores, com valores mais acessíveis para aquisição, custos de IPTU e condomínio menores, além de menos despesas de manutenção. No mais recente levantamento do Secovi-SP (sindicato das empresas de construção e habitação), referente ao mês de maio, mais da metade dos lançamentos imobiliários (52%) foram de apartamentos entre 30 m² e 45 m², enquanto outros 22% foram de menos de 30 m², o que significa que 74% dos lançamentos ficaram na faixa de até 45 m². Outros 9% também têm dimensões ligeiramente maiores, entre 45 m² e 65 m². Quem confere as plantas dos imóveis constata que o tamanho dos quartos hoje fica na faixa entre 7 m² e 15 m².
Os apartamentos pequenos caíram nas graças da classe média, sufocada pelos juros altos, que dificultam o financiamento imobiliário. Muitas construtoras passaram a ver vantagem em apartamentos menores, que cabem nos limites de financiamento do Minha Casa Minha Vida – que este ano foram atualizados para viabilizar imóveis de classe média, mas continuam não podendo passar de um teto de R$ 500 mil.
Em São Paulo, o novo Plano Diretor também teve um efeito sobre o tamanho dos imóveis, já que os novos prédios no entorno das principais vias de transporte público podem ter no máximo 50 m² e uma vaga de garagem por unidade.
Bedrotting
O encolhimento não significa que os quartos são menos importantes ou que as pessoas dedicam menos cuidado a eles. Pelo contrário, eles se tornaram a sede de um hábito batizado pelas redes sociais de bedrotting (apodrecer na cama, em tradução livre).
Confirmado pela IKEA como uma das ondas que vieram para ficar, ele significa permanecer na cama horas, mesmo antes de dormir ou depois de acordar, para usar o celular, jogar games, beliscar um lanche ou maratonar séries. Só que esses quartos são cada vez mais parecidos com casulos – pequenos e funcionais, com mais tomadas para ligar os eletrônicos, e um projeto feito com mais cuidado para tornar os espaços mais funcionais.
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