A vez do varejo e construção civil? Onde investir em ações após a manutenção da Selic
em InfoMoney, 31/julho
Especialistas recomendam ações em setores cíclicos, mas lembram que companhias defensivas ainda devem ser a base do portfólio.
A decisão do Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) pela manutenção da taxa Selic em 15% ao ano, anunciada nesta quarta-feira (30), não pegou ninguém do mercado financeiro de surpresa. Agora, o que investidores querem saber é quando os juros vão cair. Nas ações, essa discussão traz otimismo, que tem como contrapeso a pressão das políticas fiscal e comercial.
Com o ciclo de cortes no horizonte, Raphael Figueredo, o Rafi, estrategista de ações do Research da XP, diz que “agora, a renda variável se torna componente inevitável para os portfólios porque há muito valor para extrair, não só no corte de juros, como também na dinâmica econômica, principalmente se houver reformas estruturantes”. Para ele, a pausa no aperto monetário causa o questionamento da “superexposição em renda fixa”.
A recomendação de analistas para este segundo semestre de 2025 é diversificar a carteira com ações de setores cíclicos, como varejo e construção civil, antes evitados pelos investidores por causa dos juros altos. No entanto, a base da carteira não muda: ações de empresas posicionadas em setores defensivos e que performam bem mesmo em cenário macroeconômicos desafiadores ainda são as preferidas dos especialistas.
O que esperar das ações?
O fim do aperto monetário é listado por especialistas como um dos principais gatilhos positivos para as ações brasileiras. Agora, os investidores se concentram em antecipar o ciclo de cortes da Selic, o que “pode trazer um fôlego extra para a Bolsa”, segundo Gustavo Sung, economista-chefe da Suno Research.
Ainda do lado otimista está a desaceleração nos núcleos de inflação, que pode favorecer, principalmente, os papéis ligados à economia doméstica, e balanços trimestrais que vêm mostrando a resiliência das empresas em um cenário de juros altos.
A lista de fatores de pressão, porém, é extensa. Para Sidney Lima, analista da Ouro Preto Investimentos, “o principal vetor é a fragilidade fiscal, que voltou a pesar com força após o desbloqueio de bilhões no orçamento”. O especialista se refere ao anúncio feito pelo governo federal na semana passada de que o contingenciamento de R$ 31,3 bilhões nos gastos dos ministérios poderá ser reduzido para R$ 10,7 bilhões por uma melhora nas receitas.
Com o início das tarifas de 50% impostas pelos Estados Unidos sobre produtos brasileiros, Felipe Sant’Anna, especialista em investimentos da Axia Investing, diz não ver “qualquer otimismo”. Ele argumenta que “a incerteza quanto à relação com os EUA é um veneno para atrair dinheiro de fora”.
Para Marcos Moreira, sócio da WMS Capital, as ações brasileiras seguem baratas, mas, mesmo assim, ele declara que não ter “uma visão ultra otimista para a Bolsa no segundo semestre”. O preço-alvo da casa para o Ibovespa ao fim de 2025 é de 142 mil pontos, o que geraria uma valorização de 7% em relação ao preço de fechamento desta terça-feira.
Na XP, a previsão é de um Ibovespa em 150 mil pontos no fim do ano. A projeção é apoiada pelo valuation atual das companhias e “melhora gradual” dos resultados corporativos, segundo Rafi.
Onde investir?
Com os fatores de otimismo se misturando aos que devem pressionar os preços, os especialistas recomendam uma alocação focada em setores defensivos, mas com a adição de empresas posicionadas em setores ligados à economia doméstica e sensíveis aos juros.
Entre os papéis considerados defensivos, Lima vê o setor de saneamento com “oportunidades interessantes” e diz que Sabesp (SBSP3) e Sanepar (SAPR4) estão descontadas em relação ao valor patrimonial e “podem ser reprecificadas diante de avanços regulatórios, reajustes tarifários e eventual retomada do debate de privatização”.
No setor de energia, outro considerado defensivo pela geração de caixa previsível e receitas corrigidas pela inflação, o analista da Ouro Preto destaca Isa Energia (TRPL4) e Taesa (TAEE11), que “seguem relativamente atrativas, combinando previsibilidade de fluxo de caixa com dividendos robustos, o que é ainda mais valioso em um ambiente de juro real elevado”.
Entre as blue chips da Bolsa brasileira, Sant’Anna diz que “Petrobras (PETR3) é sempre uma opção resiliente”. Entre os bancos, seus destaques são Itaú (ITUB4) e Banco do Brasil (BBAS3), que “está em ótimo preço”. Para Otávio Araújo, consultor sênior da Zero Markets Brasil, o Itaú, mesmo no cenário de juros elevados “segue como referência de rentabilidade e eficiência no setor financeiro”.
Para compor o portfólio com ações cíclicas, o papel da MRV (MRVE3) foi um dos mais citados pelos analistas. Moreira lembra que a construtora tem exposição relevante ao programa Minha Casa Minha Vida e tem em sua base clientes amplamente afetados por juros e inflação elevados. Com o arrefecimento da inflação e um ciclo de corte de juros no horizonte, o mercado já começa a antecipar resultados melhores da empresa.
O sócio da WMS Capital também indica a ação da Localiza (RENT3): “a medida que juros e inflação caem, a população de baixa e média renda volta a alugar veículos”.
Para quem busca exposição ao varejo, o papel indicado por Lima é o da Lojas Renner (LREN3), que “apresenta bom histórico de execução, margens resilientes e está bem posicionada para capturar uma eventual recuperação do consumo em 2026”.
Embora “o cenário atual já permita iniciar uma alocação gradual em setores mais sensíveis aos juros”, ainda é preciso ter “seletividade e cautela”, indica Lima, que destaca: “ainda não é hora de abandonar totalmente as ações defensivas”.
Felipe Sant’Anna diz que “ficaria longe de setores frágeis, como varejo, aviação, exportadores e small caps” e diz que o ciclo de cortes na Selic “parece não estar no radar do Copom”.
Apesar de avaliar positivamente a exposição a setores cíclicos agora, Moreira lembra que empresas com custo de capital ainda elevado e margens apertadas “devem sofrer um pouco, porque não esperamos queda muito brusca na taxa de juros”. Portanto, a diversificação deve ser feita com parcimônia e considerando juros ainda altos, mesmo após os cortes que o BC deve promover em 2026.
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