Prefeitura desapropria e vai leiloar grande terreno junto à Escadaria do Selarón, na Lapa
em Diário do Rio, 18/agosto
Além do terreno de mais de 4 mil metros quadrados, 5 prédios na região da Praça XV vão ser vendidos em nome da requalificação urbana do Centro. São três imóveis com risco de desabamento, uma loja em péssimo estado e um grande casarão que pertence a uma empresa que fechou há 27 anos.
Um enorme terreno vazio há anos chama atenção a quem circula a pé ou de carro pela região dos Arcos da Lapa, junto à Escadaria do Selaron, que é hoje um dos monumentos mais visitados de toda a Cidade. Utilizado há décadas como estacionamento, o espaço aberto, que já pertenceu à família Marinho, tem quase 4 mil metros quadrados e se destaca em qualquer fotografia aérea da região. O grande espaço murado e vazio fica bem na esquina das ruas Teotônio Regadas e Joaquim Silva, e acaba de ser alvo de mais uma intervenção urbanística da Prefeitura do Rio de Janeiro: o Prefeito Eduardo Paes (PSD) publicou hoje (18/08) um decreto de desapropriação do imóvel, junto com outros 5 na região da Praça XV.
O terreno é privado e fica bem atrás do prédio da Associação Cristã de Moços (ACM) e do antológico restaurante Ernesto, que têm frente para a rua da Lapa. Segundo informações do mercado imobiliário, estaria à venda por mais de 50 milhões de reais há muitos anos, sendo ofertado a diversas construtoras. O Decreto Rio 55631, de 15 de agosto, evoca o interesse da prefeitura na “requalificação da área central da cidade (…) mediante reativação econômica, estímulo à moradia, valorização da ambiência urbana e preservação da memória histórica”.
A região da Lapa traz um histórico de grande sucesso nos lançamentos imobiliários de grande porte, e o tamanho do terreno convida à realização de projetos especiais como foi o antigo Cores da Lapa, na rua do Riachuelo, trazendo o adicional da proximidade ao terceiro ponto turístico mais visitado da cidade, que é a escadaria de azulejos coloridos criada pelo artista chileno Jorge Selarón. A região tem diversos bares e restaurantes conhecidos e desponta como novo Polo Gastronômico.
A sistemática da “desapropriação por hasta pública”, criada pelo Estatuto das Cidades e referendada pelo novo Plano Diretor da Cidade tem sido escolhida com frequência pela prefeitura e tem potencial de curar verdadeiras cicatrizes no tecido urbano da cidade, pela facilidade de se intervir em algum imóvel parado, envolvido em algum imbróglio ou alvo de excessiva especulação, sem a necessidade do município adquiri-lo ou realizar obras diretamente. “O intervencionismo estatal, em alguns casos relevantes, pode ser a única maneira de trazer dinamismo e rapidez para casos em que o desenvolvimento da cidade acaba sendo atrasado injustificadamente por um único indivíduo ou por uma disputa judicial”, explica o vice-presidente do Conselho de Renovação do Centro da Associação Comercial, Cláudio André de Castro.
Segundo informações, no local seria permitido edificar um grande condomínio. Com a publicação do decreto, o imóvel deverá agora ser avaliado pela Procuradoria Geral do Município e por fim marcado seu leilão público onde poderá ser disputado por interessados. A prefeitura incluiu no decreto, além do terreno, duas ruínas na rua Joaquim Silva (83 e 85), mas ainda deixou de fora o histórico hotel Loves House, no número 87 da mesma rua, um enorme casarão caindo aos pedaços bem na esquina da escadaria, que pertence a diversos herdeiros de uma família espanhola. O hotel, que quase foi a leilão por dívidas de IPTU, é um dos prédios históricos mais bonitos da região, embora esteja em péssimo estado.
Também estão na lista da desapropriação imóveis em condições muito ruins na Rua do Ouvidor, perto da rua do Mercado; tratam-se dos imóveis 23, 25, 27 e 29 bem no coração da alegre região do Samba da Ouvidor. Com péssimo aspecto, o imóvel 23 tem uma árvore nascendo na sua parede lateral. O 25, praticamente arruinado, já foi a leilão (sem compradores) por dívidas de IPTU de centenas de milhares de reais, e foi recentemente escorado numa ação conjunta da Prefeitura com o IPHAN; seus proprietários alegam não ter recursos para fazer o conserto, e semelhante problema atinge o 27. Construções irregulares – puxadinhos – foram feitos por cima do telhado deles e também no de número 29, uma verdadeira “favelinha” ilegal que adiciona mais peso a uma estrutura já combalida. Originalmente, estes três eram um único imóvel, que diz-se ter pertencido ao Barão da Lagoa, um dos maiores comerciantes da região, no século XIX.
Segundo esxpediente do IPHAN datado de 23 de abril falando sobre a vistoria no imóvel da Ouvidor 25, “o imóvel está em risco de desabamento, juntamente com seu vizinho de número 27“. No laudo assinado pela arquiteta e fiscal do órgão, Márcia Lopes Franqueira, o imóvel está “em avançado estado de degradação de seus materiais” e as alvenarias de pau a pique “estão se desfazendo juntamente com uma parte da cobertura que já desabou“. As construções por cima dos casarões são espúrias e num caso de restauração deverão ser demolidas.
O outro imóvel objeto do decreto de Paes foi o belo casarão da Rua do Rosário, 5, que pega duas esquinas. Fechado há mais de uma década, serviu de sede para a Interunion Capitalização, dona do célebre Papa Tudo, que anunciava em todas as TVs abertas, até a liquidação da empresa em 1998. A empresa do conhecido empresário e banqueiro Arthur Falk, condenado a 5 anos de prisão por gestão fraudulenta numa sentença que depois foi considerada prescrita, teria terminado de pagar todos os seus credores em 2018, mas o prédio de três andares segue abandonado. Tombado pelo Iphan, o imóvel possui telhado de amianto, que em algum momento deverá ser convertido em telhas francesas. Hoje, todo pichado e abandonado, é considerado por empresários da região – que floresce graças aos programas de revitalização da Prefeitura e a investimentos maciços de empresários – um entrave à sua recuperação total.
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