Fim da ocupação irregular: invasores deixam os ‘Trigêmeos do Flamengo’

em Diário do Rio, 25/setembro

Agora, os edifícios foram oficialmente entregues aos compradores do leilão de 2023, Banco BTG e Performance Empreendimentos, liberando o caminho para o pagamento das verbas trabalhistas da Santa Casa.

Os 174 apartamentos dos edifícios Anchieta, Barth e Nóbrega, os Trigêmeos do Flamengo, estão oficialmente desocupados. A confirmação foi feita nesta quinta-feira (25/09), depois de ação da Justiça do Trabalho no último dia 18, que previa notificação e aplicação de multa para quem permanecesse de forma irregular. O órgão chegou a determinar ainda o bloqueio de R$ 100 mil em bens dos ocupantes que permanecessem após o prazo definido para a saída.

O conjunto, em estilo Art Déco, foi por décadas de propriedade da Santa Casa de Misericórdia, mas acabou incluído pela Justiça do Trabalho na lista de bens destinados ao pagamento de dívidas trabalhistas da instituição. Ao todo, 1.503 trabalhadores dependem da venda dos imóveis para receber suas verbas, que estão atrasadas há mais de 10 anos.

O imbróglio das ocupações

Em 2023, os prédios foram arrematados em leilão por R$ 75 milhões pelo Banco BTG e pela Performance Empreendimentos Imobiliários, que estariam planejando um retrofit seguido de um empreendimento de alto padrão. A partir de hoje, os imóveis estão sob a posse dos novos donos. Com correções, o valor da venda pode superar R$ 80 milhões.

A Santa Casa nunca reconheceu a validade das negociações alegadas por moradores, que afirmavam ter comprado unidades de supostos intermediários ligados à instituição. Nada foi comprovado. O DIÁRIO DO RIO teve acesso a documentos de negociações de apartamentos de frente para o mar por valores entre R$ 50 mil e R$ 260 mil — nenhum assinado por alguém identificado como membro da Santa Casa. A instituição mantém que todas as ocupações irregulares são fruto de invasões recentes e que a posse precisa ser restituída integralmente, garantindo a liquidação das dívidas trabalhistas, que ainda somam cerca de R$ 130 milhões.

Desde a venda, os despejos vêm ocorrendo de forma gradual. Em maio, parte dos moradores assinou acordo que previa o pagamento de R$ 2.700 mensais, incluindo aluguel e condomínio, até a saída definitiva. Outros resistiam, com apoio da FIST, federação ligada ao Movimento Sem Teto, conhecida por atuar em invasões na cidade. Há ainda suspeitas de envolvimento de milicianos. Em visita ao local, a reportagem constatou a presença de automóveis de luxo na garagem: dois BMWs novos e um BYD estavam entre eles.

Valorização e potencial imobiliário

Os prédios, em péssimo estado de conservação, estão localizados em um dos metros quadrados mais caros do Flamengo. Projetados pelo arquiteto Robert Prentice e doados por Alberto Barth à Santa Casa, chamam atenção pelo estilo arquitetônico, varandas arrojadas, plantas amplas e vagas de garagem no subsolo e nas ruas internas.

De acordo com o corretor Marcos Queiroga, especialista na região, o contraste entre os valores de mercado e os preços pagos nas negociações contestadas é evidente. “Um apartamento de dois quartos no quarteirão não sai por menos de R$ 1 milhão, os de três quartos giram em torno de R$ 1,5 milhão e os de quatro quartos podem chegar a R$ 2,5 milhões, dependendo da vista. Duzentos e sessenta mil reais não compra nada naquele trecho do Flamengo; com sorte, um conjugado em localização inferior”, explica. A “venda de posse” não é comum na Zona Sul, já que os imóveis possuem documentação formal.

O apoio direto da Santa Casa foi essencial para a saída das famílias. A instituição arcou com aluguéis sociais, garantindo condições dignas durante a desocupação. Claudio Castro, mordomo da Santa Casa, afirmou: “Para a Misericórdia, ter resolvido de forma tranquila este episódio que contrapôs os ocupantes irregulares aos mais de 1500 trabalhadores que irão agora receber suas verbas trabalhistas foi uma grande vitória. E ter solucionado tudo seguindo a missão de caridade cristã da instituição, auxiliando aos que acabaram desalojados, é pra nós motivo de orgulho, num momento tão crucial da nossa história“

“A desocupação total do complexo predial da Praia do Flamengo vai permitir não só a amortização do passivo trabalhista da instituição como também inaugura mais uma importante fase do plano de reestruturação da Santa Casa”, confirma Maurício Osthoff, diretor jurídico da Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro.


Ver online: Diário do Rio