Lei do Distrato volta a prevalecer: STJ reafirma segurança jurídica e reage ao risco de instabilidade no mercado imobiliário

em Rota Jurídica, 12/novembro

A recente decisão da 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, no REsp 2.104.086, representa um passo decisivo para restabelecer a segurança jurídica pretendida pela Lei 13.786/2018 (Lei do Distrato). O colegiado reconheceu a plena validade da cláusula penal prevista em lei e, de forma expressa, também autorizou a retenção da taxa de fruição — inclusive mesmo na hipótese de lote não edificado. No caso concreto, a soma dos encargos legais superou os valores pagos, resultando em ausência de devolução ao comprador desistente, solução que o STJ reputou legítima e juridicamente previsível.

Essa decisão ganha relevância porque ocorre logo após um julgamento de setembro da 3ª Turma (REsp 2.106.548/SP), no qual a ministra Nancy Andrighi abriu divergência ao relativizar a aplicação da Lei do Distrato, invocando precedentes anteriores a 2018 e defendendo que o Código de Defesa do Consumidor limitaria a retenção a patamares inferiores aos previstos na legislação específica. Tal voto sinalizou risco de retorno à antiga imprevisibilidade jurisprudencial — cenário que, na prática, transformava incorporadoras e loteadoras em financiadoras forçadas do arrependimento do comprador.

Ao afirmar, agora, que a lei posterior e específica prevalece, a 4ª Turma envia mensagem clara ao mercado: contratos firmados após 2018 devem observar os critérios legais objetivos e não a flutuação jurisprudencial anterior à lei. A decisão resgata a lógica de racionalidade econômica que inspirou o legislador: permitir que o empreendedor projete fluxo de caixa, preserve o equilíbrio do empreendimento e evite repassar os custos do distrato aos demais adquirentes ou ao preço final do produto.

Mais do que uma disputa hermenêutica, trata-se de uma escolha entre previsibilidade ou caos. Sem estabilidade jurídica, o crédito imobiliário encarece, a precificação fica contaminada, e o apetite de investimento diminui. Ao reafirmar a eficácia integral da Lei do Distrato, o STJ sinaliza ao mercado que o risco do arrependimento não pode ser unilateralmente socializado às empresas do setor — condição indispensável para manter o fluxo de capital, a oferta habitacional e a expansão sustentável dos projetos imobiliários no Brasil.


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Arinilson Mariano, advogado do escritório MMF Advogados