Famílias de baixa renda no Rio de Janeiro destinam mais da metade de seus ganhos ao pagamento de aluguel. Segundo estudo do Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (Cedeplar), da UFMG, os gastos com locação de moradia chega a 65% da renda mensal familiar para quem ganha até R$ 1,9 mil.
O levantamento encomendado pela plataforma de locação de imóveis QuintoAndar, revelou que o impacto do aluguel nas contas dos mais pobres do Rio de Janeiro é o mais alto entre todas as unidades federativas analisadas pelos pesquisadores.
O levantamento utilizou dados da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), do IBGE, e estimou os impactos do mercado de locação sobre a renda das famílias.
"Na faixa de renda até R$ 1,9 mil, 65% da renda total é destinada ao aluguel, o valor mais alto de todas as UFs analisadas, o que pode refletir a pressão do mercado imobiliário e o alto custo de vida nas áreas metropolitanas. Esse percentual diminui à medida que a renda cresce, mas permanece relativamente alto", analisou o pesquisador da UFMG.
Gasto maior que a média nacional
O estudo também mostrou que o comprometimento da renda com aluguel no Rio de Janeiro é superior à média nacional em todas as faixas de renda.
Na base da pirâmide, famílias que ganham até R$ 1,9 mil destinam 65% da renda ao aluguel, enquanto a média nacional é de 48%. Na faixa seguinte, entre R$ 1,9 mil e R$ 2,8 mil, o percentual no Rio é de 29%, contra 22,9% no Brasil.
| Renda familiar até R$ 1.908 | Renda familiar de R$ 1.908 a R$ 2.862 | Renda familiar de R$ 2.862 a R$ 5.724 | Renda familiar de R$ 5.724 a R$ 9.540 | Renda familiar de R$ 9.540 a R$ 14.310 | Renda familiar de R$ 14.310 a R$ 23.850 | Renda familiar de mais de R$ 23.850 | Todas as famílias | ||
|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
| RJ | 65,1% | 29% | 18,6% | 15,5% | 13,3% | 10,5% | 7,2% | 33% | |
| MG | 36,2% | 20,5% | 14,9% | 10,3% | 9% | 6,3% | 4,7% | 20,7% | |
| SP | 44,3% | 28,9% | 18,3% | 14,8% | 11,8% | 11,4% | 11,5% | 24,1% | |
| RS | 45,4% | 21,7% | 14,9% | 10,5% | 8,5% | 6,5% | 5,2% | 20,6% | |
| Brasil | 48,1% | 22,9% | 16,1% | 12,5% | 10,4% | 8,9% | 7,6% | 25,8% |
Fonte: POF, 2018, elaboração QuintoAndar e Cedeplar/UFMG
Mesmo entre famílias com renda entre R$ 5,7 mil e R$ 9,5 mil, o peso do aluguel no Rio é de 15%, acima da média nacional de 12%.
Já entre os mais ricos, com renda superior a R$ 23,8 mil, o comprometimento cai para 7,2%, mas ainda é significativo, considerando o volume absoluto de recursos envolvidos.
Esses dados revelam que, embora o peso relativo do aluguel diminua com o aumento da renda, ele permanece elevado em todas as faixas, indicando uma pressão constante sobre o orçamento familiar.
Morador da Rocinha, na Zona Sul do Rio, o entregador Lucas de Souza, de 25 anos, mora com a avó aposentada. Juntos, os dois recebem cerca de R$ 3,1 mil por mês e gastam R$ 900 com aluguel de um pequeno apartamento de dois cômodos.
O valor representa 29% da renda familiar, o que deixa pouco espaço para despesas básicas como alimentação, transporte e contas de luz e água.
Na Zona Norte, o comerciante Carlos Henrique Almeida, 35 anos, divide um apartamento com a esposa em Vila Isabel. O casal tem renda conjunta de R$ 7,2 mil, mas paga R$ 2 mil de aluguel, o equivalente a 28% dos rendimentos da casa.
"Mesmo com um salário razoável, a sensação é de estar sempre no limite. Pagar aluguel no Rio significa adiar o sonho da casa própria", afirmou Carlos.
Comparação entre estados
Além do percentual da renda comprometida, o valor absoluto do aluguel também é mais alto no Rio de Janeiro em diversas faixas de renda, como comprovou o estudo.
Famílias que ganham até R$ 1,9 mil pagam, em média, R$ 549,64 de aluguel — valor superior ao praticado em São Paulo (R$ 502,40), Rio Grande do Sul (R$ 548,31) e Minas Gerais (R$ 378,37).
Na faixa de renda entre R$ 2,8 mil e R$ 5,7 mil, o aluguel médio no Rio é de R$ 752,73, enquanto em São Paulo é de R$ 722,70 e em Minas Gerais, R$ 588,64.
Já entre os mais ricos, o valor médio no Rio chega a R$ 2,1 mil, ficando atrás apenas de São Paulo, que registra R$ 3,7 mil nessa faixa.
Esses números indicam que o mercado imobiliário carioca impõe custos elevados às famílias, independentemente da faixa de renda, com impacto mais severo sobre os mais vulneráveis.
Receita revela concentração de renda
O estudo também analisou a receita obtida pelas famílias com aluguel de imóveis. No Rio de Janeiro, a receita média mensal é de R$ 1,9 mil, mesmo valor da média nacional. No entanto, há uma disparidade significativa entre as faixas de renda.
Famílias com renda até R$ 1,9 mil obtêm R$ 760 mensais com aluguel, enquanto aquelas com renda acima de R$ 23,8 mil recebem, em média, R$ 4 mil — mais de cinco vezes esse valor.
Essa diferença revela uma forte concentração de renda imobiliária entre os grupos de maior poder aquisitivo.
De acordo com os pesquisadores, o padrão de crescimento da receita com aluguel é acentuado nas faixas superiores, o que reforça a desigualdade no acesso à renda gerada pelo mercado de locação.
Enquanto os mais pobres enfrentam altos custos para morar, os mais ricos lucram com a valorização dos imóveis e a demanda por habitação.