Fundos imobiliários têm respiro, mas retomada deve ser em 2026

em Valor Econômico, 18/março

Cotações seguem próximas à mínima histórica, enquanto juros em alta tiram atratividade de aplicação.

Os fundos de investimento imobiliário (FIIs) tiveram um respiro em fevereiro e o Ifix, referência da classe, encerrou o mês em alta de 3,34%, a primeira desde agosto do ano passado. Como em março até dia 14 subia 2,92%, o índice passou para o campo positivo, acumulando alta de 3,09% no ano, depois de terminar 2024 com queda de 5,89%, o terceiro pior desempenho anual da série histórica. No entanto, ainda é cedo para saber se já é um movimento de recuperação, diante das incertezas em relação à economia americana e da perspectiva de novas altas da Selic no Brasil. Para gestores e analistas, uma melhora duradoura deve mesmo ficar para 2026.

O mercado estava tão negativo no início do ano que Ifix e Ibovespa, principal índice da bolsa brasileira, apresentaram forte descolamento e chegaram em janeiro a apresentar a maior diferença desde abril de 2022 (7,93%), quando o segmento ainda sofria os efeitos da pandemia, segundo levantamento de Guiherme de Luca, sócio e gestor na área de fundos imobiliários da JiveMauá, para o Valor. Ele explica que, na maior parte do tempo, os dois andam juntos, mas no primeiro mês do ano a bolsa subiu 4,86% e o Ifix caiu 3,07%. Já em fevereiro, a distância caiu, mas as direções continuaram opostas - com Ibovespa em queda de 2,64% e o Ifix, alta de 3,34% (diferença de 5,98%). Em março até o dia 14, sobe 5,01%.

Segundo Brunno Bagnariolli, sócio e CIO da estratégia imobiliária da JiveMauá, o descolamento aconteceu em janeiro e início de fevereiro porque os investidores institucionais e estrangeiros retornaram à B3Cotação de B3, enquanto os FIIs - majoritariamente de pessoas físicas - ainda estavam sob o impacto da alta no retorno das NTN-Bs, títulos públicos indexados à inflação, a IPCA mais 7,9%. “O varejo local manteve o foco nas NTN-Bs, que já estavam altas e continuaram subindo. O dinheiro continuou saindo dos FIIs”, explica Bagnariolli.

O gestor afirma que, quando há movimento de saída dos fundos imobiliários, a “porta” é mais estreita, o que potencializou o efeito e levou a esse descolamento. Na segunda quinzena de fevereiro e o início de março, a desaceleração da NTN-B a algo mais perto de 7,5% puxou a recuperação dos FIIs. “Mas, no contexto macroeconômico, a sinalização para o desempenho dos fundos imobiliários ainda é turva”, diz Danilo Barbosa, sócio e chefe da área de pesquisa do Clube FII.

As cotações dos fundos ainda estão próximas às mínimas históricas. Dados de Barbosa mostram que a diferença entre o valor de mercado - ou seja, a cotação de negociação na B3Cotação de B3 - e o valor patrimonial dos FIIs (a soma do valor dos ativos na carteira do fundo) chega a cerca de 35%, caso dos fundos de escritórios. Depois vêm os de renda urbana (aluguel de grandes lojas, como supermercados e farmácias), com 28%, shoppings (24%), galpões logísticos e híbridos (15%), fundos de fundos (13%) e os de crédito, que se beneficiam da Selic em alta e têm o menor desconto da classe (9%). “Os fundos estão exageradamente descontados, com preços equivalentes aos de 2015 e 2016, sendo que agora os fundamentos estão bem diferentes da época”, afirma De Luca.

Carolina Borges, chefe de análise da EQI Research, comenta que, com os juros elevados, a análise de curto prazo é desfavorável aos FIIs. “Diante do retorno da renda fixa e os fundos de crédito oferecendo prêmios acima do CDI, o investidor não vê vantagem nos FIIs”, diz ela. Amanhã, os analistas apostam que Selic suba a 14,25%. Conforme dados da área de pesquisa do Clube FII, os dividendos médios estão em 13,3% ao ano, no caso dos focados em crédito, e 10,3%, nos de logística, por exemplo. Borges pondera que, olhando à frente, os fundos imobiliários têm potencial de valorização tanto da cotação quanto de dividendos.

"No contexto macroeconômico, a sinalização para o desempenho dos fundos imobiliários ainda é turva” , aponta Danilo Barbosa

A executiva da EQI também destaca o exagero no descompasso entre o valor patrimonial e o de mercado. “O ‘dividend yield’ [taxa que leva em conta os proventos pagos e o valor de mercado da cota] está elevado justamente devido aos preços mais baixos das cotas. A visão de curto prazo está levando a essa assimetria entre mercado real e transações imobiliárias." De acordo com Borges, o potencial já indica que compensa aumentar aos poucos a exposição na carteira, aproveitando os preços baixos, mas com visão de longo prazo. “Sabendo que é um mercado volátil e correlacionado com juros longos”, diz ela.

Para ela, os fundos focados em renda urbana, shoppings e os híbridos, que conciliam crédito e empreendimentos reais, devem se recuperar primeiro. “Shoppings tiveram em 2024 ganho real de receita acima de 3% da inflação e no segmento logístico estamos na mínima histórica de vacância, abaixo de 9%”, diz Bagnariolli. Já para os de escritórios, também conhecidos como lajes corporativas, as perspectivas não são boas. “Não estaria entre os primeiros a retornar, porque temos desafio de vacância e alavancagem, com fundos arcando com dívidas atreladas ao CDI”, explica.

Otmar Schneider, analista de FIIs da Nord Investimentos, diz que, dos 160 fundos disponíveis hoje na B3Cotação de B3, menos de dez têm grande alavancagem. “O ideal é que não haja alavancagem, mas tomar dinheiro é uma forma de o fundo aproveitar bons momentos de mercado com preços baixos sem conseguir fazer captação no mercado.” Ele espera recuperação somente a partir de 2026, caso os juros cheguem a 15% no fim do ano.


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