Plano Diretor do Rio sancionado por Paes prevê revisão das Apacs que poderá excluir imóveis preservados
em O Globo, 18/janeiro
O Rio conta com 34 áreas que dispõem de alguma proteção legal, seja por Apac ou legislações semelhantes, incluindo Centro, Leblon, Ipanema, Botafogo, Humaitá e Urca. Nessas áreas, que são delimitadas, há restrições, por exemplo, em relação ao gabarito e nem sempre os imóveis são tombados. As regras até permitem que sejam demolidos, em alguns casos, mas os projetos novos têm que respeitar a legislação para o local.
O texto sancionado já causa controvérsias entre especialistas e moradores.
— Se o Rio foi declarado Patrimônio Mundial por sua paisagem cultural urbana pela Unesco há alguns anos, isso se deve muito às Apacs. Não acho que esse seja um momento oportuno para rediscutir as regras — diz Washington Fajardo, arquiteto e ex-secretário municipal de Planejamento Urbano.
Serviços na Urca
Outra mudança prevista no Plano Diretor sancionado ontem pode afetar o clima bucólico da Urca, na Zona Sul. Na revisão da lei urbanística, as regras específicas para construir no bairro foram mantidas. Mas, como em toda a cidade, o texto facilitou a abertura de escritórios de profissionais liberais e outras atividades comerciais em residências. Antes isso não era possível porque havia uma outra lei, da década de 1970, que agora foi revogada. Conselheira da Associação de Moradores da Urca (Amour), Valéria Grynberg defende uma revisão urgente das regras, para manter o perfil residencial do bairro:
— O texto do jeito que ficou pode gerar mais adensamento e estimular o trânsito no bairro. A Urca tem características próprias, como ter uma única entrada e uma única saída.
O subsecretário executivo de Desenvolvimento Urbano e Econômico, Thiago Dias, argumenta que o fato de o Plano Diretor prever uma revisão das Apacs não significa que algo, de fato, irá mudar. Ele não descarta, no entanto, alterações na Urca. Hoje, o bairro tem várias restrições por estar em uma Área no Entorno de Bens Tombados (AEBT), um instrumento de preservação.
— Regras de proteção não impedem que os imóveis tenham usos distintos dos atuais. Mas, de qualquer forma, o prefeito Eduardo Paes avalia criar uma Apac própria para a Urca — explica.
Autor da emenda da revisão das Apacs, o vereador Pedro Duarte (Novo) defende a inclusão do dispositivo.
— Muitas Apacs são dos anos 1980, 1990. As cidades mudam. Cabe a discussão. Será que tudo deu certo? Há imóveis que se degradaram a um ponto que já não cabe mais ser preservados? — pondera o vereador.
A presidente da Associação de Moradores de Botafogo (Amab), Regina Chiaradia, por sua vez, diz que, em caso de revisão das Apacs, seja feita uma grande discussão com os moradores antes de qualquer alteração. Ela prevê que será mais fácil mobilizar a vizinhança para discutir a proteção de imóveis do que foi durante a elaboração do Plano Diretor, porque os temas debatidos nas Apacs estão mais próximos do dia a dia do morador.
— A população tem apreço pelo bairro. Vai defender a preservação de seu patrimônio. E, se é para discutir, há a possibilidade de incluir mais imóveis na relação dos que devem ser protegidos — disse.
Ambientalista e presidente da Associação de Moradores da Rua Lauro Müller, em Botafogo, Abílio Tozzini diz que as Apacs têm outro papel, além de preservar a história dos bairros:
— Essas construções mais antigas também são mais baixas, permitindo a passagem de ar e influindo no microclima das regiões, reduzindo as ilhas de calor. Evitam que tenhamos verdadeiros paredões de concreto nos bairros.
Viés econômico
O presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo (CAU), Sydnei Menezes, vê com reservas a proposta de rever a legislação. Uma das questões é que essa discussão seria feita no âmbito da pasta que trata prioritariamente do Desenvolvimento Econômico, já que a pasta de Urbanismo foi extinta:
— O desenvolvimento urbanístico de uma cidade leva em conta sua história. Isso influencia inclusive seu crescimento. Me preocupa discutir isso com o viés econômico predominando sobre o planejamento.
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