São Paulo resiste ao ‘clube dos R$ 100 mil’

em Valor Econômico, 20/setembro

O mercado imobiliário paulistano parece distante do valor do metro quadrado praticado no Rio e em Balneário Camboriú, que supera a casa dos R$ 100 mil.

Em meados de julho, a negociação de uma cobertura duplex em um empreendimento de luxo localizado em Balneário Camboriú (SC) ganhou as manchetes do noticiário nacional e, dessa vez, não foi por causa da altura do prédio, mas do valor do metro quadrado: R$ 131 mil.

O mesmo frisson já havia sido observado meses antes, no Rio de Janeiro, quando foi anunciado o último empreendimento à venda na orla do Leblon. No Tom Delfim Moreira, edifício ultraluxuoso da Gafisa, o metro quadrado chegou a R$ 134 mil.

Os dois casos inauguram no Brasil uma espécie de “clube dos R$ 100 mil”: uma categoria de produtos novos e de altíssimo padrão que rompe o limite simbólico dos três dígitos no valor do metro quadrado e empurra a régua de preços para as alturas.

Mas o que também causa espanto nesse grupo tão exclusivo é a ausência de São Paulo. A cidade que tem o principal mercado imobiliário do país, palco de tendências que influenciam o setor nacionalmente, não registra lançamentos com valores acima dessa marca. Neste ano, o cume alcançado pelo metro quadrado de alto padrão na capital paulista ficou entre R$ 60 mil e R$ 70 mil. O que impede um avanço mais significativo?

Para Marcello Romero, CEO da Bossa Nova, a extrema dificuldade na formação de terrenos para incorporação em bairros cobiçados define a questão no Rio. “Na Zona Sul carioca, é quase impossível compor uma área para o alto padrão sem ter que comprar um prédio para demolir e construir outro no lugar. O custo do terreno fica muito elevado, e isso acaba refletindo no valor do novo imóvel”, analisa Romero.

Na comparação com São Paulo, o executivo aponta o surgimento de microrregiões de alto padrão dentro de bairros mais nobres como um dos fatores que mantêm os preços do metro quadrado em dois dígitos.

“São alternativas exploradas pelas incorporadoras para desenvolver produtos sem bancar o risco de demorar anos para montar uma área ‘premium’ no coração dos bairros. Ainda existem oportunidades assim na cidade”, explica.

A questão geográfica também é apontada por Marco Túlio Vilela Lima, CEO da Esquema Imóveis, como um dos motivos para a defasagem de preços na comparação com Rio e Balneário. Para ele, a supervalorização do metro quadrado nos casos citados está diretamente ligada à escassez de lançamentos de frente para o mar, o que justificaria preços tão altos.

“São Paulo tem uma geografia diferente, com polos de alto padrão mais espalhados. Porém, em áreas como a região entre o Clube Pinheiros e o Parque do Povo, no Itaim, já vimos coberturas revendidas a preços similares”, diz Lima.

Bateu no teto?

Outra hipótese seria uma certa indisposição do cliente de alta renda em pagar mais caro por imóveis de luxo em São Paulo. Mas essa versão divide opiniões no setor. “De maneira geral, as pessoas estão assustadas com os altos preços praticados na cidade. Em parte, a estabilidade dos valores atuais reflete isso”, afirma Romero, para quem o mercado teria chegado ao limite na capital.

“Poucos produtos conseguem ultrapassar a faixa de preços que já vem sendo praticada em bairros nobres. São somente aqueles projetos mais bem resolvidos quanto a localização, planta e lazer”, diz.

Essa percepção demandaria mais “esgrima” nas negociações com os clientes, segundo ele, que, ainda assim, identifica um momento de forte aquecimento do segmento imobiliário AAA paulistano. “Neste ano, houve aumento de 40% nas transações dos imóveis acima de R$ 3 milhões. Nas propriedades com valor entre R$ 10 milhões e R$ 15 milhões, o crescimento foi ainda maior: 56% na comparação com 2023”, informa Romero.

Para Vilela Lima, como o mercado está com forte demanda, o topo de valores tende a ser superado ao longo do tempo. As operações da Esquema Imóveis, acrescenta ele, deverão crescer 50% em volume neste ano. “O mercado vai testando o limite dos preços. Há uma década, isso ocorreu no Jardim Europa, quando o metro quadrado ultrapassou R$ 10 mil. Hoje, é vendido pelo dobro desse valor”, recorda Lima.

A sensação é que o teto ainda não foi atingido no alto padrão da capital paulista, avalia Cyro Naufel, diretor Institucional do Grupo Lopes — pelo contrário. “A revisão recente do Plano Diretor Estratégico (PDE) de São Paulo tornou possível para as incorporadoras comprar terrenos antes inviáveis para construção, criando uma perspectiva de elevação no preço do metro quadrado nos novos lançamentos”, afirma.

Para ele, o momento é favorável à compra no segmento AAA. “Com a aquisição de novos terrenos em bairros nobres, as incorporadoras já planejam seus lançamentos sob tendência de alta. Tudo indica que os preços subirão, portanto, é hora de decidir a compra.”


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