Com a nova alta de juros, é um bom momento de comprar imóveis?

em O Globo, 30/janeiro

Mercado imobiliário reagiu de forma negativa à recente elevação da Selic.

O mercado imobiliário reagiu de forma negativa à recente elevação da taxa Selic em 1 ponto percentual. A decisão, que levou os juros para 13,25% ao ano, impacta diretamente o setor ao encarecer o crédito, reduzir a capacidade de financiamento dos compradores e pressionar as empresas do ramo, consideram. Mesmo com os juros altos, a concessão de crédito imobiliário em 2024 bateu recorde histórico atingindo R$ 312 bilhões, representando um crescimento de 25% em relação ao ano anterior.

Mas é um bom momento para comprar imóveis? Flávia Moraes, professora de economia do Ibmec-RJ, analisa que a decisão depende de vários fatores, mas via de regra, o imóvel, assim como qualquer ativo, tende a perder valor quando a taxa de juros aumenta.

 Um ativo é, por definição, algo que gera rendimentos futuros. No caso de um imóvel, ele pode render aluguéis ou uma valorização quando você o vende. Por exemplo, se você compra um imóvel por R$100 mil e o vende por R$150 mil três anos depois, você teve um ganho de R$50 mil em três anos. Isso representa um rendimento.

Ela lembra que o mercado financeiro estima mais altas de juros para este ano (uma alta de 1 ponto já foi sinalizada pelo Banco Central na decisão de ontem).

 Assim, se você está pensando em adquirir um imóvel, pode ser mais vantajoso comprar antes que os juros aumentem ainda mais.

Repercussão no mercado

Em nota, a ABRAINC (Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias) alertou que a alta dos juros agrava os desafios econômicos, desestimula investimentos e onera ainda mais a dívida pública. A entidade destaca que cada ponto percentual a mais na Selic adiciona cerca de R$ 48 bilhões ao custo anual da dívida pública, o que impacta diretamente empresas e famílias. O efeito já pode ser sentido nas recuperações judiciais, que atingiram 2,2 mil pedidos em 2024, um recorde desde 2005, com alta de 61,8% em relação ao ano anterior, segundo o Serasa.

 Medidas para controlar a trajetória crescente da dívida pública são essenciais para termos uma taxa de juros em padrão saudável a médio e longo prazo. Isso vai destravar investimentos e incentivar o crescimento do país de forma sustentada. Conviver com juros elevados trava o desenvolvimento, reduz a geração de empregos e penaliza empresas e famílias - ressalta o presidente da ABRAINC, Luiz França.

Ricardo Affonseca, CEO da Aros Inc, destaca que o aumento da Selic também encarece os projetos das incorporadoras, reduzindo os lançamentos imobiliários no próximo ciclo.

 Os financiamentos imobiliários vão encarecer, desaquecendo o setor. A camada mais afetada será a classe média, pois a população de renda mais baixa conta com subsídios do Minha Casa, Minha Vida, enquanto a alta renda não depende de financiamentos.

Já Thiago Andrade, diretor da JB Andrade Imóveis, avalia que a alta dos juros encarece as taxas de financiamento, reduzindo o poder de compra dos consumidores e pressionando os custos das construtoras, que já enfrentam desafios com o índice Nacional da Construção Civil (INCC). Para Thiago Balassiano, diretor da Balassiano Engenharia, a Selic elevada impacta o setor tanto no financiamento quanto nas vendas.

 Hoje, para tomar qualquer crédito, a base de referência já é de pelo menos 15% ao ano. Para projetos de longo prazo, como os do setor imobiliário, isso significa inviabilidade para muitos empreendimentos - explica.

Ele ressalta que, no segmento de alto padrão, o impacto é menor, pois a decisão de compra é menos influenciada pelos juros. Mas Nayara Técia, CEO do Grupo On Brokers, pontua que, com a Selic elevada, muitos investidores preferem manter o dinheiro aplicado em vez de investir em imóveis.

 Com a taxa a 13,25%, uma pessoa com R$ 1 milhão aplicado tem um rendimento mensal de R$ 10,4 mil, o que pode desestimular a compra de um imóvel financiado - afirma.

Apesar do impacto negativo, Nayara Técia destaca que a alta da Selic pode gerar oportunidades, como campanhas de descontos para reduzir estoques de imóveis e um aumento no interesse de compradores estrangeiros, beneficiados pela alta do dólar.

Thiago Soares, diretor da The Inc Incorporações, critica o cenário econômico que mantém os juros elevados.

 A Selic alta é um freio para o Brasil inteiro. Com o crédito mais caro, as vendas caem, os lançamentos diminuem e a construção civil perde fôlego. O governo precisa equilibrar as contas para permitir uma redução sustentável dos juros - argumenta.

Já Jamille Dias, consultora da Riviera Construções, explica que a alta dos juros reduz a liquidez do mercado.

 Se menos pessoas estão comprando imóveis, os vendedores podem precisar reduzir os preços. Além disso, os investidores podem optar por ativos de renda fixa, que passam a oferecer retornos mais atrativos - conclui.


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