Centro do Rio atrai retrofit e megaprojetos habitacionais

em Valor Econômico, 16/setembro

Incorporadoras veem mercado com concorrência menor do que em São Paulo e espaço para crescer na zona central e portuária.

A região central e portuária do Rio passa por uma renovação imobiliária com empreendimentos de milhares de unidades e reformas de prédios históricos.

Após a Copa do Mundo e as Olimpíadas de 2016, a capital fluminense passou por anos difíceis. Grandes incorporadoras reduziram sua atuação na cidade, como Cyrela, Tegra e Helbor.

Agora os números estão subindo, e há quem veja espaço para crescer. Os lançamentos avançaram 35% e as vendas cresceram 12,6% no primeiro semestre, em número de unidades, segundo a Brain Inteligência Estratégica.

A comparação com São Paulo, porém, mostra o quanto é possível avançar. A capital paulista, com 84% mais moradores, lançou 41,4 mil unidades de janeiro a junho, ante 7,7 mil da capital fluminense.

A AZO, incorporadora que nasceu em Campinas (SP), escolheu o Rio para a sua primeira expansão geográfica, em 2022. José de Albuquerque, CEO da empresa, conta que chegou a olhar mais de 30 oportunidades de desenvolver prédios em São Paulo, mas nenhuma foi “de brilhar os olhos”. “É um mercado muito competitivo, tem que investir muito capital para comprar terreno, [pagando] em dinheiro, fazer operações de dívida para se alavancar”, diz.

Ele chegou a trabalhar no Rio durante as quase três décadas que passou na Brookfield Incorporações (atual Tegra) e revisitou a cidade. “Fiquei positivamente impactado com o mercado, compramos terrenos de maneira mais fácil, pagando a prazo ou com muita permuta”, afirma, citando que também há menos competidores e baixo estoque.

A empresa está reformando um prédio antigo na Gávea e viu a oportunidade de comprar da Companhia Carioca de Parcerias e Investimentos (Ccpar) o edifício A Noite, por R$ 36 milhões. O prédio, inaugurado em 1929, foi sede do jornal A Noite e da Rádio Nacional, mas estava fechado há 10 anos. Será convertido em residencial, com 447 estúdios, de 30 m2 a 71 m2. As obras começam em novembro, com previsão de entrega para 2027. O valor geral de venda (VGV) deve ser de R$ 250 milhões.

A um quilômetro dali, o Moinho Fluminense, primeiro moinho de trigo do país, também pode ser transformado. Desde 2015, já teve dois projetos de reforma que não avançaram, e em junho foi desapropriado pela prefeitura. Agora, quem está de olho nele é o francês Alex Allard, idealizador do Cidade Matarazzo, que transformou um antigo hospital paulistano em hotel de luxo e espaço de arte.

Allard apresentou um projeto para o prefeito Eduardo Paes (PSD), que prevê a conversão do Moinho em hotel, residencial e galeria de arte, segundo o jornal “O Globo”. Procurado pelo Valor, o empresário não quis comentar a proposta neste momento.

A incorporadora Cury está construindo um empreendimento na região central e lançou mais prédios ao lado, na região do Porto Maravilha, que reúne os bairros de Saúde, Santo Cristo e São Cristóvão. Somando as duas áreas, a empresa já lançou 7,5 mil unidades - só restam 100 em estoque, conta o vice-presidente comercial Leonardo Mesquita. Deve colocar mais 800 no mercado em novembro.

A região do Porto é o eixo de crescimento da Cury na área mais central do Rio. Mesquita conta que a empresa levou três anos para conseguir lançar o primeiro projeto por ali, o que incluiu conversas com a Caixa e a prefeitura, porque na década passada o plano era que a região se tornasse uma zona corporativa, o que não foi adiante. Ele cita que a iniciativa da Cury foi ao encontro do Reviver Centro, política da prefeitura do Rio para atrair mais moradores para a área, com benefícios para a reforma de prédios e criação de moradias.

A Cury é uma incorporadora econômica, mas seus empreendimentos na região não são voltados para as classes mais baixas. Mesquita afirma que na zona portuária já “não cabem mais” projetos para as faixas iniciais do Minha Casa, Minha Vida (MCMV). A boa localização, com muito transporte público disponível, faz com que os apartamentos se encaixem apenas na última faixa do programa (para famílias com renda de R$ 4,4 mil a R$ 8 mil) e fora dele.

A mineira Emccamp, que já construiu projetos para as faixas iniciais do MCMV, também se entusiasmou com a região e viu a oportunidade de fazer empreendimentos mais valorizados. A companhia lançou em 2022 um empreendimento com 1,5 mil unidades, que está 80% vendido. A venda foi mais rápida do que o esperado, conta o diretor financeiro André Avelar, porque as unidades também foram comercializadas para a faixa 3 e fora do programa, por R$ 300 mil a R$ 500 mil cada.

A empresa já prospecta novos terrenos na área. A Cury tem ali um banco de terrenos avaliado em R$ 2 bilhões em VGV.

Somadas, Cury, Emccamp e AZO já ultrapassam 10,2 mil novas moradias. Albuquerque afirma que na região vivem cerca de 37 mil pessoas, número que pode quase dobrar com os novos projetos.

Mesquita diz que os primeiros moradores da Cury devem chegar em 2025. Para atender esse novo público, tanto a empresa quanto a Emccamp estão construindo comércios nos prédios. Albuquerque, porém, ainda considera que falta um “grande shopping center” por ali. A ideia é que os moradores não precisem se deslocar muito.

“Olhando o Rio, essa região tem posição estratégica em localização e infraestrutura”, diz Mesquita, citando o acesso a VLT, metrô e trem, a proximidade com a rodoviária, com os dois aeroportos da cidade e com vias importantes, como a Avenida Brasil, a Linha Vermelha e a ponte Rio-Niterói.


Ver online: Valor Econômico