Imóvel fica até 30% mais barato com cooperativa habitacional

em Valor Econômico, 5/julho

Oferta de crédito imobiliário cresce, mas oferta ainda é tímida entre instituições.

O cooperativismo tem ajudado o setor de construção civil a viabilizar projetos nos mais diferentes segmentos e permitido que milhares de pessoas realizem o sonho da casa própria. Criada em 2007, em Goiânia, por servidores públicos estaduais, a Cooperacinco já entregou 1.160 residências e conta com outras 433 em construção e 824 em lançamento. Adonídeo Vieira Júnior, diretor da organização, afirma que o mercado imobiliário está aquecido na capital goiana, e o modelo associativo permite reduzir custos. “Especialmente agora, quando o Índice Nacional dos Custos da Construção [INCC] está abaixo da inflação do setor”, diz.

O diretor explica que, para cada novo projeto, uma nova cooperativa é criada, com CNPJ próprio. “Isso ajuda a mitigar riscos de construção e de inadimplência dos empreendimentos”, diz.

O cooperativismo também é uma alternativa para atender o segmento de baixa renda. “Queremos que todos tenham acesso à moradia digna”, afirma Roberto do Nascimento, consultor técnico da cooperativa Baalbek. Atuando desde 2008 na Baixada Santista (SP), a instituição conta com 7,5 mil associados e já beneficiou 950 famílias. Os imóveis são adquiridos pelo preço de custo, o que representa uma redução de 30% em relação ao valor de mercado, explica Nascimento.

O consultor acrescenta que a Baalbek opera junto a um público que hoje não é atendido pelo mercado ou pelo Estado. Para garantir o sucesso da operação, a instituição conta com recursos para mitigar os riscos. “Vinte por cento das parcelas destinadas para a compra de uma casa vão para o fundo de contingência, que nos protege dos riscos de inadimplência e construção”, explica Nascimento. “As sobras não utilizadas da contingência são devolvidas aos associados”. Ele aposta no crescimento das cooperativas habitacionais. “Há muita demanda reprimida”, avalia.

O setor imobiliário também busca no cooperativismo uma alternativa para a concessão de crédito. Mas a oferta ainda é tímida. Segundo especialistas, isso ocorre porque geralmente as operações com imóveis têm alto valor e prazos de duração mais longos. Por isso, a maior parte dos financiamentos imobiliários no setor, hoje, é feita por meio de centrais que reúnem várias instituições associativas, e que portanto possuem mais capacidade de captação.

É o caso do Sicredi, que conta uma carteira de R$ 2,5 bilhões em financiamento imobiliário (SFH e SFI), alta de 19% nos últimos 12 meses, com foco no cliente pessoa física de áreas urbanas, em especial nas regiões Sul e Centro-Oeste. Segundo Sairon Monticelli Lima, gerente de produtos de crédito doa organização, há um grande potencial de crescimento no crédito imobiliário em geral, e isso também se aplica às cooperativas. “O Sicredi tem um share of wallet [participação dentro da carteira] de 4%, o que demonstra um grande potencial de crescimento ainda dentro da nossa base”, diz.

Sairon explica que o mercado tem passado por uma fase de esgotamento de fontes baratas, especialmente a poupança e o FGTS, o que tem levado o mercado a buscar alternativas de funding complementares que tragam novas alavancas ao setor. “Esse movimento pode beneficiar o setor, especialmente as cooperativas de crédito que operam fortemente com o agronegócio e direcionam a captação em poupança para o crédito rural, com fontes mais acessíveis, que têm potencial de alavancar negócios”, avalia o gerente.

Já o sistema Ailos, que reúne 13 cooperativas na região Sul do país e em São Paulo, onde começou a operar recentemente, teve um crescimento de 57% na carteira de empréstimos imobiliários entre 2022 e 2023. “Temos um volume de aproximadamente R$ 400 milhões em créditos imobiliários concedidos e queremos dobrar esse número até o final do ano”, diz o economista Samuel Rese, especialista em crédito imobiliário da organização.

— Martina Zajakoff
Rese avalia ser possível aproveitar o aquecimento do mercado imobiliário para atingir esse objetivo. “O mercado tem crescido este ano e as cooperativas têm capacidade para absorver boa parte dessa alta”, afirma. Ele observa que as cooperativas que operam no segmento também podem se beneficiar das mudanças na legislação de garantias de imóveis, que pode tornar as taxas de juros mais competitivas.

O novo marco das garantias imobiliárias foi promulgado em outubro do ano passado, mas ainda aguarda regulamentação. Pelas novas regras, será possível usar o mesmo imóvel como garantia em mais de uma operação de crédito, com prioridade de recuperação da garantia para o credor mais antigo. “Ainda não está claro como será a gestão de risco e a execução dessas garantias, mas estamos esperando a regulação para começar a experimentar esse novo modelo no segundo semestre”, continua Rese.

Para Martina Zajakoff, sócia especializada em direito imobiliário do escritório Machado Meyer, a entrada das cooperativas no segmento é positiva. “Elas podem reduzir a burocracia e trazer mais competição ao mercado”, avalia. A advogada observa ainda que, do ponto de vista do comprador, o modelo de financiamento pela cooperativa é similar ao de um consórcio. “A diferença é que, na cooperativa, o comprador é um sócio da instituição”, afirma.

Zajakoff explica ainda que o financiamento de imóveis por meio de cooperativas é sujeito às mesmas leis que regem o crédito imobiliário, como a proibição de juros abusivos e a proteção do cooperado pelo Fundo Garantidor de Crédito (FGC). “É sempre importante avaliar o patrimônio e a carteira de crédito das cooperativas, avaliar bem a qualidade desse crédito, para fechar o negócio com segurança”, conclui.


Ver online: Valor Econômico