Incorporadoras voltam à faixa 1 do MCMV
em Valor Econômico, 23/outubro
Programas estaduais e municipais também ajudam a tornar viáveis projetos para baixa renda.
O setor imobiliário evitava trabalhar com a faixa inicial do programa Minha Casa, Minha Vida (MCMV), após problemas com o repasse dos recursos na década passada, que chegou a paralisar obras e colocou construtoras em apuros. Agora, o governo tenta mudar essa imagem, e o setor tem buscado acompanhar.
O MCMV é dividido em três faixas, e a etapa inicial também tem uma divisão: ela pode ser financiada tanto por recursos do FGTS quanto por recursos da União, vindos do Fundo de Arrendamento Residencial (FAR) ou do Fundo de Desenvolvimento Social (FDS). Além da origem do dinheiro que financia a obra, a diferença é que as unidades com saldo do FGTS são vendidas diretamente ao cliente final, enquanto nas outras é o poder público que seleciona os moradores.
As contratações voltaram a ocorrer neste ano. Segundo a Caixa Econômica Federal, que faz a operação do programa, foram autorizadas, até outubro, 77,3 mil unidades com recursos do FAR. A expectativa do banco é atingir 115 mil unidades até dezembro.
“No começo fica todo mundo com o pé atrás, porque sofreu muito para entregar [os projetos] em 2015, com falta de pagamento”, afirma Marcos Vinicius, sócio e diretor da incorporadora Habras, que atua no segmento.
A incorporadora constrói, atualmente, 1,5 mil unidades na faixa 1 do MCMV, com projetos em Guarulhos e em São Paulo. Antes da Habras, no início dos anos 2010, Vinicius teve outra incorporadora que só atuava na faixa 1 com recursos da União, o que hoje vê como um erro. “Não pode estar toda em uma faixa só”, diz. “Muitas empresas sumiram do mercado porque acabou o funding”. A Habras também constrói em outras faixas do MCMV e fora do programa.
Não é simples viabilizar os projetos nos dois segmentos - as unidades precisam ser baratas, para serem acessadas por famílias com renda de até R$ 2.850 - mas o problema dos repasses estava localizado nas obras com recursos do FAR e do FDS.
Em evento da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), em setembro, o Ministro das Cidades, Jader Filho (MDB), fez a assinatura de 1.088 unidades para esse modelo do MCMV, com as incorporadoras Direcional, Emccamp e Jotanunes. “Podem investir, que não vai faltar dinheiro”, afirmou o ministro, que tenta motivar mais companhias a atenderem a faixa 1.
Não à toa, no mesmo evento, a vice-presidente de habitação da Caixa, Inês Magalhães, elogiou a decisão do governo de separar já no ano passado parte do orçamento e depositá-lo no FAR, “como sinalização que teremos recursos para fazer habitação para as famílias que não conseguem acessar o crédito imobiliário”.
A quebra dessa desconfiança ainda está em andamento. Renée Silveira, diretora de incorporação da Plano&Plano, que tem 24% do “market share” do segmento de imóveis econômicos em São Paulo, conta que a empresa começou a lançar na faixa 1 neste ano, mas que fica restrita às unidades financiadas pelo FGTS. “FAR e FDS são licitações públicas, existem muitas alterações, mudanças políticas”, diz. “Como gestão de risco da companhia, não é o nosso foco.”
No começo fica todo mundo com o pé atrás, porque sofreu muito para entregar em 2015, com falta de pagamento”
— Marcos Vinicius
Também há preocupação com a disponibilidade de recursos do FGTS no médio e longo prazo, pois ele tem sido usado para outros fins, como o saque-aniversário, criticado pelo setor imobiliário. No entanto, o FGTS tem um conselho curador, ressalta Silveira, que dá segurança sobre o orçamento do ano.
A empresa já lançou 3,5 mil unidades na faixa 1 e deve lançar outras 4,2 mil até o fim do ano.
Para além dos recursos do FGTS, a Plano atua no Pode Entrar, programa da prefeitura paulistana que utiliza o orçamento municipal para contratar unidades. A empresa tem 1,9 mil unidades dentro do programa.
A RZK Empreendimentos também aderiu ao Pode Entrar, com 6,2 mil unidades, conta Verena Balas, diretora de incorporação. A companhia, que desenvolve o bairro planejado Reserva Raposo, em São Paulo, está aberta a ter empreendimentos na faixa 1 do MCMV no futuro, segundo a executiva. “Tenho outras 10 mil unidades para desenvolver e o Reserva é focado em interesse social”, diz.
Outro programa habitacional, o Casa Paulista, do governo do Estado de São Paulo, ajuda a viabilizar as unidades do próprio MCMV. Na faixa 1 com recursos da União, o preço do apartamento é limitado a R$ 170 mil. Viabilizar esse valor na região de São Paulo, com terrenos caros, exige a união de forças.
Em parceria com a Caixa, o programa faz aportes de cerca de R$ 20 mil por unidade, em projetos já selecionados. “É o que dá suporte para o projeto parar em pé”, afirma Vinicius. O empreendimento também é mais simples, com poucas áreas comuns. Além do custo do projeto, a ideia é manter o condomínio barato.
A meta do Ministério das Cidades é terminar 2026 com 2 milhões de unidades contratadas no MCMV, em todas as faixas, mas Jader Filho afirmou, no mês passado, que poderiam ultrapassar esse número.
Do total, são esperadas 500 mil unidades com recursos da União, segundo o ministro. Levando-se em conta que a Caixa prevê terminar o ano com 115 mil contratações, será preciso aumentar o ritmo para atingir a meta.
Ver online: Valor Econômico