Morre, aos 100 anos, Carlos Carvalho, fundador da construtora Carvalho Hosken e ‘dono da Barra da Tijuca’

em O Globo, 11/agosto

Carlos Fernando de Carvalho, o empreiteiro que mudou a paisagem urbana da Zona Oeste do Rio por meio da construtora Carvalho Hosken e chegou a ganhar o apelido de “dono da Barra da Tijuca”, morreu neste sábado aos 100 anos.

Dr. Carlos, como era chamado por amigos e colegas, morreu de causas naturais. Ele estava internado no Hospital Samaritano Barra. A informação foi confirmada pela assessoria de comunicação da Carvalho Hosken, da qual era controlador e presidente do conselho de administração.

Nascido em Jacarepaguá em uma época em que a Zona Oeste carioca era mais rural que urbana, Carvalho seguiu a profissão do pai ao se formar na Escola Politécnica de Engenharia em 1949. Dois anos depois, fundou a Carvalho Hosken. O sócio na empreiteira, Jacques Hosken, desligou-se do negócio pouco depois, e Carlos Carvalho seguiu em voo solo, mas mantendo o nome original.

Sua primeira grande aposta imobiliária se deu nos anos 1960, nos arredores de Brasília. A cidade acabara de ser criada como nova capital federal e protagonizava um boom imobiliário. Depois, o engenheiro concentrou negócios na construção de condomínios de alto padrão no Leblon, enquanto amealhava terrenos para a ofensiva que caracterizaria seu legado nas décadas seguintes: transformar a Barra da Tijuca, espécie de “sertão” inabitado àquela altura, em um novo aglomerado urbano com ares de Miami.

10 milhões de metros

Carlos fez parte de um grupo de quatro empresários que compraram terras baratas para erguer projetos residenciais e comerciais na região, como Múcio Athayde, o italiano Pasquale Mauro e Tjong Hiong Oei, o “Chinês da Barra”.

Ao todo, Carlos Carvalho acumulou cerca de 10 milhões de metros quadrados na região, que duas décadas depois se tornaria o principal vetor da expansão urbana da cidade. Por meio da Carvalho Hosken, o empresário ergueu bairros planejados que definiram a cara do bairro, como Península, Rio2 e Cidade Jardim.

Segundo a construtora, a Carvalho Hosken já lançou mais de 20 mil unidades na Barra desde os anos 1970, atraindo 80 mil moradores e, de acordo com relatório recente do Secovi (sindicato que reúne condomínios), gerando R$ 120 milhões anuais em IPTU.

A Barra da Tijuca recebeu grande parte dos investimentos para as Olimpíadas de 2016, quando Carvalho apareceu pela primeira vez na lista de bilionários da Bloomberg, com fortuna líquida estimada em US$ 4,2 bilhões à época.

Os negócios olímpicos deram dor de cabeça ao empresário, porém: o grupo acaba de vender ao BTG Pactual o Ilha Pura, condomínio de 31 torres residenciais que foi a Vila dos Atletas nos Jogos e cujo lançamento difícil pesou por anos no balanço da construtora.

O Ilha Pura também foi o estopim de um litígio com a Cyrela. A incorporadora de Elie Horn, sócia frequente da Carvalho Hosken em empreendimentos na região, ficou de fora do projeto, que acabou sendo erguido em parceria com a Odebrecht. A disputa foi parar em tribunal arbitral.

Também na época das Olimpíadas, Carlos Carvalho se envolveu em polêmica internacional quando, em entrevistas ao jornal britânico The Guardian e à BBC Brasil, disse que a Barra era um novo Rio e que o Ilha Pura não poderia servir de moradia para pessoas pobres. Posteriormente, o empresário se defendeu das críticas alegando que suas declarações foram mal interpretadas.

Cidadão benemérito

O engenheiro deixa esposa, a artista plástica Heliana Lustman, quatro filhos, oito netos, três bisnetos e uma longa coleção de obras de arte, uma de suas paixões. Um de seus filhos, o caçula Carlos Felipe de Carvalho — fruto do casamento com a Miss Brasil 1965, Maria Raquel de Andrade —, é o atual CEO da Carvalho Hosken.

— Meu pai sempre nos conduziu com uma visão ousada e empreendedora, muito motivada por seu sonho pessoal de ver uma Barra e um Rio mais prósperos. Ele cumpriu sua missão, e eu sinto um enorme privilégio de, em nome de toda a família, dar continuidade a esse legado tão grandioso — disse o CEO à coluna.

Dias antes de completar 100 anos, em maio, Carlos Carvalho recebeu do prefeito Eduardo Paes o título de “cidadão benemérito do Rio” em cerimônia no Hilton Barra, um dos ativos da construtora.

O velório ocorrerá na segunda-feira, às 10h, no Crematório da Penitência, no Caju.


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