Para todos os gostos: preços de estúdios no Rio vão de R$ 268 mil a R$ 3,5 milhões

em O Globo, 7/outubro

Empresas criam coleções para seus compactos, que já contam com facilidades como shuttle, bar, maleiro e até ’pranchário’.

Do básico ao de luxo; do destinado à moradia ao voltado à locação de curta temporada; do sem espaço para carros ao que possui vagas com manobrista. A diversidade é grande, inclusive em número de unidades, mas o que não muda é o padrão compacto dos chamados estúdios ou lofts — a versão moderna das antigas quitinetes —, que viraram queridinhos do mercado imobiliário. Um empreendimento na Barra da Tijuca, na Zona Oeste do Rio, chega a ter mais de mil apartamentos com área de 33 a 38 metros quadrados. Outro, nas proximidades do aeroporto Santos Dumont, no Centro, foi idealizado com 575 imóveis pequenos. E, como o negócio prospera, há empresas que criaram linhas para unificar seus edifícios desse segmento.

Para tentar atender às necessidades dos consumidores, existem projetos que preveem a construção de “pranchário" (para guardar pranchas), piscina de borda infinita, maleiro e bar. Um empreendimento inclui entre as facilidades serviço de shuttle e bicicletário. Também são levados em consideração os diferentes níveis de renda dos eventuais compradores, e os preços dos apartamentos chegam a variar de R$ 268 mil a mais de R$ 2 milhões, podendo alcançar 3,5 milhões, no caso de estúdios de cobertura com área externa e piscina no Leblon, na Zona Sul do Rio.

A febre dos edifícios com unidades enxutas vem provocando uma mudança de perfil dos novos imóveis da cidade. Dados do Sindicato da Habitação do Rio de Janeiro (Secovi Rio) revelam que, no ano passado, foram lançados três vezes mais estúdios (1.667) do que unidades de quatro quartos (538). Em 2022 e 2023, os lofts superaram os sala e quarto em lançamentos e vendas.

Compactos: 13,6% dos lançamentos

Já informações do Sindicato da Indústria da Construção Civil no estado (Sinduscon-Rio) mostram que, desde 2019, quando entrou em vigor o novo Código de Obras, que passou a permitir unidades pequenas (as quitinetes estavam proibidas desde 1970), foram colocados à venda na cidade 12.165 compactos (estúdios e sala e quarto), que representam 13,6% do total de imóveis novos negociados no mesmo período (89.287).

Mais recentemente, os estúdios receberam outros estímulos: o programa Reviver Centro — que a partir de 2021 criou regras urbanísticas e edilícias para incentivar a construção de residenciais na região central — e o novo Plano Diretor — sancionado em janeiro deste ano, que restringiu a exigência de vagas de garagem.

— Diferentemente de cidades como São Paulo, o Rio começou mais tarde a autorizar unidades compactas e tem muito espaço de oportunidade de crescimento. Existe uma grande demanda. A configuração das famílias mudou. Muitos não querem casar ou ter filhos, a população de idosos aumentou e a cidade é um polo universitário. Houve ainda uma mudança de comportamento das pessoas. Hoje, quarto de empregada não é mais uma necessidade. Muitos querem um apartamento compacto num local onde a mobilidade seja fácil — analisa Claudio Hermolin, presidente do Sinduscon-Rio.

Presidente da Associação de Dirigentes de Empresas do Mercado Imobiliário do Rio (Ademi-RJ), Marcos Saceanu está convencido de que a tendência é surgirem ainda vários empreendimentos compactos na cidade:

— Desde 2019, quando voltaram a permitir imóveis compactos, projetos estão sendo desenvolvidos com muito sucesso, porque essa tipologia de apartamento tem um potencial de aluguel maravilhoso, além de atrair diversos públicos, como estudantes, solteiros, idosos, turistas, etc…Veremos ainda diversos lançamentos oferecendo esse produto, em vários bairros da cidade, com empreendimentos muito bem concebidos, com lazer e serviços.

Para Chicão Bulhões, secretário municipal de Desenvolvimento Urbano e Econômico, o mercado incorporador entendeu que esses modelos atendem melhor às demandas atuais, "tanto que são os primeiros a serem vendidos":

— Como poder público, estamos desburocratizando e dando incentivos para a construção de mais unidades habitacionais.

‘Adoro o conceito estúdio’

Morador de um flat alugado nas proximidades do Niemeyer 360º Residences, na Barra da Tijuca, o diretor de cinema e TV Daniel Ghivelder, de 46 anos, adquiriu um estúdio, com cerca de 40m2, no terceiro andar do empreendimento, assim que ele foi lançado.

— Sou solteiro e adoro o conceito estúdio. O que comprei, ainda por cima, é em um prédio que leva a assinatura do Niemeyer (o arquiteto Oscar Niemeyer) e tem uma estrutura moderna — justifica.

Rebatizado, o Niemeyer 360°, da Capital1, era a antiga Torre H, arranha-céu redondo, de 120 metros de altura, do projeto Athaydeville, cujas obras foram paralisadas há quatro décadas atrás. No prédio, com previsão de entrega em dezembro de 2025, haverá área de lazer, com piscina de borda infinita e quadras de beach tênis, e rooftop. São 455 estúdios, com 40m2, e 13 duplex, com 80m2. Os preços começam em R$ 661 mil.

— O apartamento é pequeno, prático. E, quando você necessita, tem serviços oferecidos pelo condomínio. Em poucas palavras, você pode ter uma vida que só um multimilionário poderia ter. É o que a gente chama de economia compartilhada. Você usufrui sem precisar ter só para si — diz Antonio Osório Filho, sócio administrador da Capital 1

Ainda na Barra, a Calper lançou recentemente um bairro planejado. O Arte Design terá quatro blocos, com 1.554 unidades, sendo 90% estúdios. Os preços começam em R$ 268 mil.

— A permissão de construção de estúdios corrige uma injustiça que vinha desde 1970. Tem gente morando em franja de comunidade, porque não podia comprar um imóvel maior. O ideal é que a cidade do Rio tenha 50 mil estúdios, sendo 25 mil na Zona Oeste e 25 mil no Centro e na Zona Norte — defende Ricardo Ranauro, CEO da Calper.

Foco no morador

No Centro, o Cores do Rio, da W3, foi o primeiro do Reviver a ser licenciado pela prefeitura e a ficar pronto. Metade das suas 120 unidades tem cerca de 35m2 e preços a partir de R$ 280 mil. Não há vagas de garagem. A empresa já lançou dois outros da série Cores, um no bairro de Fátima e outro perto da estação do metrô de São Francisco Xavier (Tijuca), todos tendo foco no morador.

— A gente não acredita, por exemplo, em lavanderia para quem vai morar. Tem que ter tanque e espaço máquina e lavar, embora seja estúdio — explica Flávio Wrobel, diretor da W3.

Funcionária do Corpo de Bombeiros, Weena Costa, de 40 anos, comprou uma unidade no Cores da Tijuca, com cerca de 35m2, prevista para ser entregue em maio de 2027. Ela mora com a filha, de 14 anos, num alugado no próprio bairro.

— O estúdio é bem versátil, flexível. Posso morar, ceder para a minha filha, alugar por temporada quando não estiver morando — avalia.

De olho no investimento

Também no Centro, perto do Aeroporto Santos Dumont, vai nascer mais um empreendimento, neste caso direcionado para o investidor, tanto o que compra para locação por curta temporada quanto o que ocupa e aluga quando não está no Rio. Com fila de espera, a RJZ Cyrela pretende lançar, até o início de novembro, o Gate by Yoo, com 575 estúdios, de 28 a 38 m2, e preços a partir de R$ 390 mil. Haverá apenas quatro apartamentos de dois quartos na cobertura.

Com grife, o projeto leva a assinatura do estúdio londrino Yoo. O espaço comum terá piscina de borda infinita, academia, bar, espaço de coworking, bicicletário e 84 vagas de garagem. O condomínio será de R$ 15 por metro quadrado, começando em R$ 450.

— Apesar de ficar a seis minutos a pé do Santos Dumont, o local terá shuttle para o aeroporto e para a Cinelândia — conta Matheus Aranha, coordenador de incorporação da RJZ Cyrella.

Ainda com vocação para locação de curta temporada, no Leblon, na Zona Sul, será lançado dia 10 o primeiro prédio da coleção Stay, da Aros Inc., no ponto onde funcionou a boate Melt e em terrenos vizinhos. Ocupará um quarteirão inteiro da Avenida General San Martin, entre a Rua Rita Ludolf e a Praça Atahualpa. De alto padrão, terá travertino na fachada. Serão 58 apartamentos, de 34 a 87m2, distribuídos por oito andares. Os preços são a partir de R$ 2 milhões. Haverá seis estúdios na cobertura, três lineares e três duplex: os maiores, com piscina na área externa, custarão R$ 3,5 milhões.

— O Stay Ludolf terá tudo do bom e do melhor: piscina, sauna, bar, lavanderia, academia, maleiro, vagas com manobrista e “pranchário” — cita Ricardo Affonseca, CEO da Aros Inc., revelando que a empresa está de olho em cinco terreno em Leblon e Ipanema para mais unidades da coleção Stay. — Há uma demanda reprimida no Leblon e em Ipanema.

Mais um prédio de luxo concebido para investidor, a ser lançado em novembro, é o Amaré, na Rua Raul Pompeia, em Copacabana, do Grupo CTV. Será feito um retrofit no edifício do antigo Clube de Bridge. O empreendimento terá 22 unidades, sendo 19 estúdios, com até 41m2. Os outros três apartamentos, de cobertura, serão duplex, com entradas nos dois andares.

— Os preços dos imóveis vão variar de cerca de R$ 1 milhão a R$ 2 milhões, e o condomínio ficará entre R$ 15 e R$ 20 por m2 — conta Pedro Magalhães, diretor de Expansão do Grupo CTV.

Reviver: 70% moradia

Ernesto Otero, CEO da startup Lobie, que faz a gestão de prédios de apartamentos compactos, afirma que 80% dos compradores dos 13 empreendimentos com os quais sua empresa fez parceria são investidores ou adquiriam o imóvel para utilizar uma parte do tempo e alugar quando não estiver morando:

— Isso ocorre porque o Rio tem a característica de ser uma cidade turística.

Mas, no caso do Reviver Centro, a maioria das vendas é para moradia. Segundo Claudio Hermolin, desde o início do programa, foram lançados 11 projetos, com 1.750 unidades, 80% delas estúdios e quarto e sala. Do total, 78% foram vendidas, e destas, 70% para pessoas que querem residir nos apartamentos.

O fato é que o rítmo de lançamentos e vendas dos lofts é grande. Sócio-fundador da SIG Engenharia, Schalom Grimberg comemora a venda, na primeira semana após o lançamento, de metade das 39 unidades — entre 29 e 86m2 — do OUI Ipanema Studios, na Rua Visconde de Pirajá, com preços a partir de R$ 900 mil.

— Vamos construir no décimo-primeiro andar um rooftop com sauna e piscina. Faremos uma estrutura com rentabilidade para quem comprar — garante Grimberg.

O Opportunity Fundo de investimento Imobiliário e o Brix Fundo de Investimento Imobiliário, por sua vez, criaram a coleção Be.in.Rio, exclusiva para unidades compactas. Três prédios estão sendo vendidos, em Copacabana, Arpoador e Ipanema. O quarto lançamento será em Ipanema, na Rua Gomes Carneiro, com 33 unidades e Valor Geral de Vendas (VGV) aproximado de R$ 88 milhões. Pela coleção, deverão ser lançados mais dois edifícios até o fim do ano, ambos em Ipanema.

Mesmo apostando nos compactos, Marcelo Naidich, um dos gestores do Opportunity diz que a empresa constrói imóveis de todas as tipologias, incluindo os grandes, e argumenta que cada uma delas tem seu público.

— O que vai definir o tamanho da unidade é a fase de vida do cliente no momento da aquisição — diz ele. — As plantas generosas têm o seu valor e despertam a atenção de compradores do Rio, de outros estados e até de outros países.

’Os órgãos de planejamento precisam atuar’

Representantes de empresas do mercado imobiliário lembram que condomínios estão proibindo que apartamentos sejam usados para aluguel por curta temporada. Proprietários vêm ingressando na Justiça, mas o Superior Tribunal de Justiça (STJ) têm dado sentenças favoráveis aos condomínios que não possuem a autorização expressa na sua convenção. Os novos empreendimentos, dizem incorporadores e construtores, vêm suprir também essa lacuna, e já nascem com essa autorização.

Apesar do sucesso de vendas dos lofts, Paulo Takito, sócio-diretor da Urban Systems, consultoria de inteligência de mercado, faz um alerta a quem comprar para alugar por curta temporada. Ressalta que uma coisa é atender à demanda, e outra à especulação. Para ele, o investidor pode correr risco ao comprar imóveis muito caros para alugar.

— Será que haverá pessoas para alugar? Existe um mercado para esses imóveis, mas ele é limitado. É possível que o dono tenha que abaixar o preço para conseguir alugar — adverte ele, acrescentando que, no futuro, a prefeitura poderá adotar medidas para regulamentar esse mercado, se estiver, por exemplo, impactando os preços dos aluguéis tradicionais.

Diante de um mercado com tamanha ebulição, o arquiteto e urbanista Luiz Fernando Janot defende a necessidade de os setores públicos acompanharem o impacto das transformações, para que possam criar normas, caso necessário, como está acontecendo na Europa:

— A cidade sempre refletirá o comportamento da sociedade nela instalada. No caso atual, em função de demandas de mercado e de interesses de gerar capital, empregos e negócios, não há dúvidas de que a cidade vai mudar — analisa Janot. — Os órgãos de planejamento não podem permitir criarem mini apartamentos de forma indiscriminada e a volta dos tão criticados "cabeças de porco", construídos no passado principalmente em Copacabana.


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