“Queremos ser reconhecidos como uma autêntica marca de luxo imobiliário”

em Valor Econômico, 28/junho

Entrevista | Sheyla Castro Resende e Luis Fernando Ortiz, CEO e vice-presidente de Negócios da Gafisa S.A.

Sheyla Castro Resende e Luis Fernando Ortiz — CEO e vice-presidente de Negócios da Gafisa, respectivamente — estão no comando do leme que está mudando a rota da companhia para o alto padrão. Uma tarefa nada fácil em se tratando de um “transatlântico” que acaba de completar 70 anos e que já navegou por tantos e diversos mercados.

Eles ajustaram a proa rumo ao luxo ainda em 2020 e, agora, chegam ao primeiro “checkpoint”: a entrega do edifício Tom, com apenas seis apartamentos, na orla do Leblon, um dos mais sofisticados do Brasil. Conheça a seguir um pouco mais dessa jornada.

O que simboliza a entrega do superexclusivo Tom Delfim Moreira, no mês do 70º aniversário da Gafisa?

Sheyla Resende — A consolidação da marca no alto padrão, depois de um longo processo de reposicionamento da companhia, iniciado há quatro anos, para dar foco exclusivo ao segmento. O Tom simboliza essa grande virada.

Por que a opção pelo alto padrão?

Sheyla — Foi uma convicção. Há um cliente de alto padrão para ser atendido, e nos preparamos muito para isso. Foi uma transição feita com todo o cuidado, treinamento de equipes, contratação de consultorias especializadas e reestruturação de áreas e processos. Hoje, por exemplo, os contratos são elaborados em vários idiomas. Os profissionais da área comercial no Rio de Janeiro falam três ou quatro línguas para atender a clientela internacional. Só vamos alcançar nossos objetivos nesse segmento se a companhia inteira estiver bem preparada.

Luis Fernando Ortiz — E não foi uma escolha aleatória. Fizemos uma pesquisa profunda do mercado imobiliário nacional há alguns anos e identificamos que esse segmento estava muito pulverizado, com incorporadoras vivendo de oportunidades esporádicas. E nós pensamos de outra forma: queríamos focar apenas no alto padrão porque isso nos permitiria relacionar mais com esse ecossistema e nos tornar mais capacitados para alcançar a perfeição que o alto padrão exige. É uma visão estratégica também: quanto mais a marca for identificada como de luxo, mais facilidade teremos em elevar nossa performance comercial.

A Gafisa quer ser a ‘Chanel’ do mercado imobiliário do Brasil?

Sheyla – É uma boa associação. De fato, queremos ser reconhecidos como uma autêntica marca de luxo imobiliário. Buscamos inspiração em “brands” que transcendem o nosso segmento – de moda, por exemplo – para aprender sobre atendimento, qualidade de produto e exclusividade. Afinal, nosso cliente também compra joias, relógios, carros de luxo, e precisamos entregar uma experiência de consumo similar.

Como foi a performance da companhia em 2023 e qual expectativa para este ano?

Sheyla – Em 2023, a Gafisa concluiu a entrega de seis empreendimentos. Para este ano, a empresa continua reafirmando o posicionamento de sua marca como uma das principais empresas do mercado imobiliário de alto padrão do país, buscando novas oportunidades de modelos de negócios, diversificando o formato de comercialização e maximizando a rentabilidade. Neste ano, além do Tom Delfim Moreira, a companhia entregou quatro empreendimentos: o Normandie Moema e High Line Jardins, ambos em São Paulo, e Ivo (Botafogo) e Igara (Leblon), no Rio. As perspectivas para este ano são muito boas, com destaque para dois projetos de frente para o mar: Canto (Arpoador) e Cyano (Barra da Tijuca).

Qual é o ‘next level’?

Ortiz – Pretendemos seguir fazendo projetos como o Tom: únicos, com curadoria de terrenos, ativos especiais e de ótima arquitetura. Aprofundar ainda mais esse “storytelling” e mostrar nossa capacidade em realizar empreendimentos assim, irreplicáveis.
O que torna o Tom irreplicável?

Ortiz – Desde o princípio, tratamos o residencial como uma joia: foi construído no último terreno disponível na orla do Leblon, suas dimensões mais reduzidas exigiram soluções técnicas muito criativas para explorar todas as possibilidades de uso, a proposta de uma fachada escultural – de acordo com os arquitetos do escritório Gensler, foi inspirada nas ondas do mar, nas montanhas do Rio e no calçadão da praia –, uma planta totalmente personalizável, e a inserção de uma galeria de arte no lobby do prédio. Do lado de fora também há uma obra da artista Iole de Freitas, deixada como gentileza para a cidade.

Sheyla – Existem premissas básicas que foram obedecidas: buscar o melhor terreno, da melhor rua e no melhor bairro da cidade e, sobre ele, desenvolver um produto único. Sem isso, corre-se o risco de fazer um produto “quase de luxo”, o que é um perigo para a imagem e a reputação da companhia. Sobretudo, temos que ser muito rígidos e fiéis à nossa narrativa para saber dizer ‘não’ a oportunidades tentadoras que surgem no mercado, mas que não entregariam uma experiência imobiliária de luxo plena como entendemos que deve ser.

A arquitetura autoral virou uma necessidade no alto padrão brasileiro nos últimos anos. Por quê?

Ortiz – Tem uma questão histórica: o mercado imobiliário brasileiro passou décadas preocupado com escala e redução de custos. A atenção estava mais voltada para a planta dos apartamentos do que com fachadas mais interessantes. A convicção era que o cliente não pagaria a mais por isso.

Com a elevação dos preços dos imóveis e do nível de conhecimento dos clientes, o grau de exigência aumentou muito. É um fenômeno que acabou sendo muito positivo para o mercado, porque fez todos os “players” se movimentarem. Hoje, virou um processo de seleção natural. Pode ser que a lógica do custo/benefício ainda funcione em algumas categorias de produtos, mas para quem está no topo dessa pirâmide, no ultra luxo, não existe a menor possibilidade de se trabalhar em escala. Cada projeto precisa ser tratado como único, e isso passa pela escolha da arquitetura mais autoral.
Mansões suspensas do Cyano Exclusive Residences, na Barra da Tijuca — Foto: Divulgação/Gafisa

Rio ou São Paulo: onde o mercado está mais luxuoso?

Ortiz – São praças diferentes, e o mercado imobiliário é muito local. Temos a responsabilidade de assumir isso na hora de definir um projeto. Não é possível fazer o mesmo empreendimento no Rio e em São Paulo. É preciso entender cada bairro, cada cidade e a dinâmica particular, para fazer boas escolhas de projeto. Os arquitetos sempre apresentam propostas incríveis, mas é o incorporador que decide o que será realizado. Ele é o maestro e deve fazer a escolha com base na visão desse lugar.

É verdade que vocês dois visitam os canteiros de surpresa, para checar cada detalhe?

Sheyla – Sim, e de forma recorrente. Procuramos cuidar de tudo, em cada etapa do processo: desde a colocação do tapume até o momento da entrega do imóvel. O luxo está nos detalhes, e nós nos viramos em mil para verificar de perto cada fase do projeto. Em um relacionamento longo com o cliente, como acontece no setor imobiliário, a ruptura de um único detalhe pode significar a perda da confiança, e isso queremos evitar.


Ver online: Valor Econômico