Corte de juros nos EUA ajuda setor imobiliário

em Valor Econômico, 1º/outubro

Brasileiros que atuam no segmento apontam interesse de conterrâneos em investir no país.

A primeira queda nos juros americanos em quatro anos, anunciada em setembro pelo Fed, o banco central dos Estados Unidos, deve incentivar o mercado imobiliário local, que tem atraído investidores brasileiros.

Não que o ambiente de taxa alta e inflação acima da média para o país chegasse a assustar quem já fazia negócios no Brasil, diz Ricardo Costa, sócio da RBR Asset Management responsável pela operação nos EUA. “Estamos acostumados mas, aqui, isso não acontecia desde os anos 1970”, afirma.

A RBR, que é especializada no setor imobiliário, tem, ao todo, R$ 10,5 bilhões sob gestão, dos quais 10% ficam fora do Brasil, e atrai quem deseja diversificar seus investimentos. São três estratégias, todas envolvendo imóveis, como compra de prédios de apartamentos antigos em Nova York, para serem reformados e vendidos, exclusivamente para locação (modelo chamado de “multifamily”), empréstimo para desenvolvimento de ativos imobiliários e a compra de prédios para o portfólio próprio de multifamily.

Nas duas últimas estratégias, além da Costa Leste americana, também entra o Cinturão do Sol, região ao sul, que vai da Flórida à Califórnia, e atrai brasileiros para investir, passear e viver.

Com a queda de 0,5 ponto nos juros, agora em 4,75% a 5% ao ano, a empresa pode ficar menos alavancada e também precisa colocar menos dinheiro próprio nos projetos, afirma Costa. Há sinalização do FED para mais dois cortes de 0,25 ponto neste ano.

No entanto, a RBR também se beneficiou do período de juros e inflação mais altos, porque havia menos concorrência pelos ativos que eles queriam comprar, e os prêmios para os empréstimos que faziam eram maiores.

A maior parte dos investidores da RBR nos Estados Unidos é de brasileiros. Segundo Costa, a gestora tem conseguido gerar um retorno líquido de 15% ao ano.

O mercado imobiliário americano atrai brasileiros porque é mais fácil para eles entenderem para onde o dinheiro está indo, analisa João Vianna, sócio-fundador da Loft que agora comanda a Invisto. Seu negócio compra residências antigas em bairros desejados de Orlando e Winter Park, na Flórida, para demoli-las e então construir novas residências, maiores e mais caras.

A empresa começou a operar em 2022 e já vendeu 5 casas, com um primeiro fundo de US$ 65 milhões. Lançou um segundo fundo, de US$ 150 milhões, para chegar a 67 residências. Cerca de 90% dos investidores são brasileiros.

Hoje, é consenso nos EUA, e tema frequente da disputa presidencial, que faltam casas no país. Após a crise de 2008, gerada por uma bolha imobiliária nos EUA, que por sua vez veio do excesso de crédito e de incentivos para moradia, construtoras recuaram na produção. As casas americanas feitas no pós-guerra, em madeira, quando o país viveu um boom de construção, também estão ficando velhas.

“Todo mundo acha que a próxima crise virá do mesmo lugar que a última, mas ela nunca vem”, diz Vianna. Porém, relatório do UBS Wealth Management, divulgado em setembro, aponta que Miami é a cidade com maior chance de ter uma bolha imobiliária no mundo. O índice calcula a probabilidade em 1,79. Valores acima de 1,5 são considerados altos. São Paulo tem a menor chance, de 0,04.

“Impulsionados por um mercado de luxo em expansão, os preços em Miami subiram quase 50% em termos reais desde o final de 2019”, aponta o relatório. Dessa alta, 7% veio nos últimos quatro trimestres, e o aumento dos preços dos imóveis se dissociou do incremento da renda, o que eleva a chance de uma bolha.

O banco Goldman Sachs também destacou, em relatório sobre a Resia, unidade do grupo MRVCotação de MRV&Co nos EUA, que a oferta de moradia no Cinturão do Sol está caindo mais rápido do que o esperado, o que pode levar à alta do preço de locação em 2025 e 2026.

A Resia constrói prédios multifamily e os vende quando já estão prontos e ocupados. A empresa anunciou, nesta segunda-feira (30), a venda de um projeto, em Miami por US$ 118,5 milhões, com margem bruta de 9,3%.

Em entrevista ao Valor em agosto, o diretor-financeiro da MRV, Ricardo Paixão, disse que um corte de juros nos EUA favoreceria a operação, e que vendas de ativos eram esperadas para o segundo semestre. Procurada, a Resia declinou de participar da reportagem.

Em relatório, analistas do SantanderCotação de Santander classificam a venda como “marginalmente positiva”. Eles esperam que mais dois projetos sejam vendidos em 2024, no Texas, mas com margens menores.

A MRV tem buscado um investidor para a Resia e cogita separá-la do grupo. A divisão tem queimado caixa e contribuído para a alavancagem do grupo nos últimos trimestres - o relatório do Goldman Sachs nota que a Resia é responsável por R$ 3,6 bilhões ou 40% da alavancagem da MRV. Também há a percepção de que os investidores não estão captando o potencial de valor do negócio americano.


Ver online: Valor Econômico