Inovação na construção civil foca em soluções para reduzir a pegada
em Valor Econômico, 19/dezembro
Tecnologias mais recentes buscam contribuir para a contenção do aquecimento global, mas projetos ainda são embrionários.
Materiais inovadores, sustentáveis, de baixo impacto ambiental e até soluções que otimizam a eficiência e a durabilidade de obras estão mudando a forma de construir e ajudando a resolver problemas do passado. Nos últimos anos foram criados hidrocerâmicas, isolamentos térmicos, telhas solares, espuma de alumínio, tijolos biológicos, madeira transparente e até concreto biológico que usa bactérias para resolver, também, problemas de fissuras e rachaduras em estruturas urbanas.
“As principais inovações do setor estão ligadas às tentativas de redução de CO2, alinhando a construção com práticas mais sustentáveis e modernas. São inúmeras opções. Mas, aqui no Brasil, ainda estão em estágios iniciais, sem participação expressiva no mercado nacional”, explica Valter Frigieri Júnior, diretor de desenvolvimento e mercado da Associação Brasileira de Cimento Portland (ABCP).
Marcos Serafim, gerente de design e inovação do Centro Cerâmico do Brasil (CCB), diz também que, embora algumas dessas tecnologias estejam disponíveis no país, muitas delas são ainda embrionárias, limitadas a pesquisas acadêmicas, projetos experimentais ou nichos específicos de mercado. Serafim e Frigieri concordam que essas inovações têm potencial para transformar o setor da construção nacional.
“Há um esforço contínuo de investimentos das indústrias de cimento e de aço para que se ofereça ao mercado produtos de menor emissão”, aponta Frigieri. No caso do cimento, envolve não apenas a produção deste material com menor pegada ambiental, mas também com foco em processos que facilitam e agilizam a construção. Um desses está relacionado à impressão 3D para a produção de estruturas de concreto.
O diretor da ABCP informa que, em parceria com a Universidade de São Paulo (USP), além da participação de empresas do setor, players do mercado imobiliário, indústria de materiais e de equipamentos e uma startup, foi criado um hub de inovação para estudar e desenvolver aplicações práticas de impressão 3D na construção. O desafio do projeto, denominado hubIC 3D, é estruturar soluções para viabilizar essa técnica.
“Nos últimos 12 meses, obtivemos avanços significativos, incluindo a impressão do protótipo de uma cozinha”, diz Ronaldo Motta, vice-presidente de engenharia e produção da MRV. Segundo ele, os custos iniciais têm se mostrado promissores e, mantendo o ritmo de desenvolvimento, é possível que em dois a três anos essa tecnologia poderá atingir um nível de competitividade “muito interessante”.
O executivo da MRV acrescenta que um dos principais desafios superados até agora é o desenvolvimento da tecnologia da argamassa, que analogamente funciona como a “tinta” de uma impressora. “Melhorar a eficiência desse material é crucial para reduzir custos e aumentar a velocidade da impressão em 3D, consolidando a viabilidade [técnica e econômica] desse sistema construtivo no mercado”, diz Motta.
A MRV vem incorporando em suas obras soluções que permitem e ampliam o acesso de seus clientes à energia limpa e renovável. Até agora, segundo o executivo, mais de 250 obras já foram entregues com sistemas de energia solar fotovoltaica nas áreas comuns dos empreendimentos. “A empresa alcançou uma redução superior a 20% nas emissões de CO2, resultado do investimento em soluções de baixo carbono, como a energia renovável e concreto ecoeficiente”, afirma Motta.
A Construtora Tenda inovou na agilidade. Criou uma divisão de casas pré-fabricadas que batizou de Alea. O modelo consiste na construção off-site, em que partes da casa são produzidas em uma fábrica e, depois, montadas no canteiro, com potencial de reduzir o uso de mão de obra em até 94%. Luiz Garcia, CFO da empresa, explica, por exemplo, que o método tradicional de construção de uma casa de 44 metros quadrados em alvenaria exige, em média, oito pessoas e um mês de trabalho. “Com o método off-site e tecnologia woodframe, uma casa do mesmo tamanho utiliza no máximo uma pessoa e precisa de metade do tempo”, afirma .
A Tenda incorporou ainda a “kitização” de materiais no seu centro de distribuição e transformação (CDT). Os materiais recebidos no CDT são agrupados em kits específicos para cada apartamento e atividade, como distribuição de água, ramal de gás, ramal de esgoto e itens de fixação de esquadrias de alumínio, entre outros. “Isso tem permitido a diminuição da área de armazenamento no canteiro de obras e melhorado a logística”, explica Garcia.
No segmento de materiais de acabamento, a Roca desenvolveu cubas de bordas finas e de alta resistência (30% acima das tradicionais) para banheiros, possibilitando soluções estéticas e alinhadas às tendências de arquitetura e design. Sérgio Melfi, diretor do grupo Roca no Brasil, diz ainda que a empresa começou a usar neste ano novos fornos para a produção de louças sanitárias. “Esses avanços tecnológicos reforçam nosso compromisso com a eficiência operacional e a sustentabilidade, reduzindo o consumo de gás e otimizando os processos”, diz.
A inteligência artificial (IA) vem sendo usada por praticamente todos os principais players do setor para melhorar a eficiência, a gestão, o monitoramento e a segurança de canteiros de obras, além de reduzir custos e desperdícios. Nos últimos dois anos, a empresa de engenharia SH, que aluga equipamentos (andaimes e escoramentos metálicos, entre eles), investiu R$ 100 milhões em inovação, em tecnologia e IA. Neste campo, criou uma plataforma digital para a consulta e gestão de contratos a partir de qualquer lugar e dispositivo. Com isso, o cliente pode acompanhar seu contrato de locação e visitas técnicas virtuais, entre outros.
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